Escritores Frustrados: Quando o acolhimento pelo sistema literário não vem

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Pequeno escritor sonhador
Autores fracassados, uni-vos!

Ser acolhido pelo sistema literário é o ponto primordial da aceitação e consagração de um escritor como tal. Está entranhada nos paradigmas da literatura, sabe-se lá desde quando, a premissa de que um escritor só existe se for publicado, lido, e conhecido, nem que seja por subgrupos ou segmentos menos influentes da sociedade.

Assim, é necessário saber como se esquematiza o tal “sistema literário”, está entidade muitas vezes tão cruel. A relação se expressa da seguinte forma:
autor -> mercado editorial -> leitor.

A partir disso, é possível concluir que um escritor não é um escritor sem uma publicação, sem a estruturação formal e táctil de sua obra, com capa, miolo, e valor monetário agregado (vale frisar que, mesmo hoje, na era das mídias digitais, o livro continua a ser um produto, então a estruturação permanece). Portanto, o sistema nos leva a crer que, sem um “mecenas”, não há público, e, consequentemente, no anonimato, toda a produção do escritor também é ilusória, vazia, à medida que, apesar de ter seu próprio rol de influências, não influencia nada, é de alcance limitadíssimo ou inexistente.

Então o romance e demais gêneros – desmistificando utopias albergadas no peito dos que amam o ofício da escrita -, são, antes de tudo, uma institucionalização, já que precisam de audiência e amparo editorial. O sistema é duro ao dizer: “Todo mundo se acha escritor, mas só o é quem me conquista”.

Duramente, hoje, o Brasil anuncia um dos palcos menos propícios à ascensão de aspirantes literatos. Até mesmo os talentosos estão fadados a um embargo bruto por parte das convenções, porque, para as estruturas acirradas, não basta “escrever bem”, é fundamental, além de conquistar seu lugar ao sol do mercado, também redigir com profunda maestria, com método, saber burilar o texto e trabalhá-lo tecnicamente, dominando todos os aspectos da narrativa. Só aí, vencido este estágio, conjuntamente aos anteriores, o autor é assimilado e respaldado pelo academicismo e pela classe intelectual autoritária.

Todavia, apesar de tristonhos os horizontes pintados para os que cultivam o sonho literário, não se pode esquecer que o público, aquele elemento que ocupa a parte final, mas fundamental na corrente sistemática das vendas e da aceitação, não é simplesmente uma categoria amórfica, só mais um elemento da equação. O público é vivo, é humano, tem sede.

As pessoas trazem em si a necessidade de ficção, de fantasia, de se perder dentro da irrealidade e suas gradações de verossimilhança. O público clama, anseia. E não se prende aos brutos fatos, tais quais: No Brasil, dificilmente um autor independente consegue concretizar sua obra com menos de alguns milhares de reais. No Brasil, dificilmente os autores chegam às livrarias, e aqueles que o fazem mal conseguem suplantar o caos da concorrência, permanecendo amontoados por lá em pilhas e pilhas sem demanda. No Brasil, dificilmente a primeira edição de um livro sai com impressiva quantidade de cópias, limitando ainda mais sua disseminação.

Os leitores não estão interessados nisso. Os leitores querem, simplesmente, ler e conhecer. Estão dispostos a arriscar a imperturbabilidade de suas vidas, aceitando a próxima viagem proposta por qualquer sugestão literária que lhes arrebate os sentidos de primeira, ou até de segunda. Só o que o leitor quer mesmo é se entregar…

Escritor

Assim, agora, é possível discernir com razoável clareza: As arduidades do universo das letras não estão concentradas nas pontas do cordão anteriormente ilustrado (ou seja, a problemática não é nem o autor, nem o leitor), mas os entraves estão no próprio funil editorial, naquilo que atua como intermediador entre a produção e o acesso… E tal mediação, tristemente, é segregativa, implacável, falsamente “promotora de cultura”.

Vejamos: Empresas que lidam com livros hoje, no Brasil, arrecadam muito mais com as traduções dos best-sellers do que com autores nacionais. De tal maneira, alimentam o ciclo da falta de oportunidade, e permanecem sem distribuir votos de confiança, estímulo e patrocínio a novos autores brasileiros, os quais anseiam pela chance de ser, quem sabe, lidos um dia.

Agora, não devemos deixar que essa visão mundana esgane todas as aspirações mais profundas e fortes que das quais se alimenta toda uma classe valente, que não se rende nem cede com facilidade, e, de fato, não deve jamais fazê-lo. Afinal, um escritor, para merecer o título, ama ardorosamente o que faz. E basta amar para ser. Não escreve porque o obrigam, escreve porque tem um chamado íntimo, ao qual aceitou e quis responder. E não desiste, mesmo quando o sistema o repele, pisoteia ou o ignora.

Dessa forma, é cabível dizer com convicção que o sistema está quadradamente errado: Um escritor não precisa de diagramação e papel offset para ser visto (principalmente por si mesmo) como tal, porque os verdadeiros escritores escrevem, e escrevem, e permanecem escrevendo ainda que o reconhecimento não chegue da maneira como foi desejado, e permanece mesmo sem nenhuma obra publicada, e permanece mesmo que o anonimato seja seu maior público interessado.

Ninguém precisa desistir desses sonhos, nem mesmo por entender que as chances são escassas: Existem outras formas de se concretizar a chama, outros modos de se chegar à ascensão, à eminência, à aclamação… É certo que mecanismos secundário não são os mais potentes ou rentáveis exatamente por não fazerem parte do tradicionalismo da imprensa, mas, se o caso é ser lido, então tudo é válido.

Já que, enfim, o que um escritor quer é isto mesmo: Ser lido. Este é o seu Nobel pessoal. Ser devorado, chorado. E não estritamente comprado. Que se danem as estruturas, pois bem. E que os autores frustrados não se acanhem de atuarem como os “Van Goghs” da literatura: Em vida, nenhum reconhecimento “válido”. Mas, depois disso, quem sabe?… A magnitude da arte é grande, e perdura. O importante é nunca deixar de escrever.

5 Comentários


  1. Mesmo depois da hegemonia da net, bibliotecas virtuais, o livro propriamente dito (impresso) ainda tem o seu valor.

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  2. Gosto de ler e ter livros em minha estante… Então, continuo tendo fé nos que escrevem. Parabéns pela publicação."Já que, enfim, o que um escritor quer é isto mesmo: Ser lido. Este é o seu Nobel pessoal. Ser devorado, chorado. E não estritamente comprado. Que se danem as estruturas, pois bem. E que os autores frustrados não se acanhem de atuarem como os “Van Goghs” da literatura: Em vida, nenhum reconhecimento “válido”. Mas, depois disso, quem sabe?… A magnitude da arte é grande, e perdura. O importante é nunca deixar de escrever.

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    1. Parafraseando "um pouco" os escritos do escritor – Dia a dia publicado aqui no Face, tenho esta
      que dedico ao Jurandir Barbosa Poeta.

      Já é tarde

      Porque não se remenda projetos
      Os cabelos estão brancos,
      O corpo encurvado,
      E o rosto espremido entre as mãos.
      Há rugas na testa,
      Pele seca, sofrimento e tristeza…
      O pensamento se dispersou,
      Porque as ideias se foram…
      Já é tarde e a música parou.
      O papel continua em branco…
      A caneta já não escreve mais,
      Porque a tinta também secou.
      Delza Marques.

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